terça-feira, janeiro 09, 2007

Histórias de mabaças



[São Cosme e São Damião, do alto de seus tronos diminutos, não imaginariam se tornar o pivô de meus pensamentos em plena segunda feira de ardiloso labor - um dia de verão, para mim, irritantemente ensolarado.]

Trago duas historinhas com a ajuda da memória e do wikipedia:

1. Os relatos sobre os santos gêmeos atestam que eram originários da Arábia, de uma família nobre de pais cristãos, no século III. Estudaram medicina na Síria e foram praticá-la na Egéia e Ásia Menor. Diziam: "Nós curamos as doenças em nome de Jesus Cristo e pelo seu poder". O culto aos dois irmãos é muito antigo e há registros sobre eles desde o século V. Os escritos relatam a existência, em certas igrejas, de um óleo com o seus nomes que tinha o poder de curar doenças e dar filhos a mulheres estéreis. Seus nomes verdadeiros eram Acta e Passio. Surgiram várias versões para suas mortes e uma delas explica que os irmãos realizavam milagres e, por isso, foram amarrados e jogados em um despenhadeiro sob a acusação de feitiçaria. Em outra versão, na primeira tentativa de morte, foram afogados, mas salvos por anjos. Na segunda, foram queimados, mas o fogo não lhes causou dano algum. Apedrejados na terceira vez, as pedras voltaram para trás sem atingi-los. Por fim, morreram degolados.

2. Ártemis, deusa grega da caça e da vida selvagem, saiu primeiro da barriga de Letó e pôde inaugurar seu título de deusa dos nascimentos auxiliando no parto de seu irmão gêmeo Apolo. Zeus, seu pai, presenteou-a com uma corte de ninfas que, como ela, escolheram a castidade e fê-la rainha dos bosques. Uma lenda conta que ela se apaixonou perdidamente pelo jovem Órion e, se dispondo ao casamento, provocou a fúria de seu ciumento irmão. Apolo impediu o enlace mediante uma grande perfídia: achando-se em uma praia, na companhia da irmã, desafiou-a a atingir com a sua flecha prateada um ponto negro que indicava a tona da água e que mal se distinguia, devido à distância. Ártemis, vaidosa, retesou o arco e atingiu tranquilamente o alvo, que logo desapareceu no mar, fazendo-se substituir por uma mancha ensangüentada. Era Órion que ali nadava, fugindo de um imenso escorpião criado por Apolo para persegui-lo. Ao saber do desastre, Ártemis, desesperada, fez com que o pai transformasse a vítima e o escorpião em constelação. Assim, quando a constelação de Órion se põe, a de escorpião nasce, sempre o perseguindo, mas sem nunca alcançar.


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Histórias sobre gêmeos, não sem motivo, sempre me causaram encantamento. Mas poderia tranquilamente não causar, se considerado o sem número de vezes em que tive que parar para responder a perguntas do tipo: "quando uma fica doente a outra também fica?", ou "vocês lêem o pensamento uma da outra?". Ainda a mais freqüente e estupefante de todas: "como é ser gêmea?". Aprendi a retrucar: como é não ser gêmea, se já nasci assim?

O recente nascimento de gêmeos ingleses, um branco e o outro preto, foi manchete por dias nos jornais do mundo inteiro. Embora não corresponda exatamente a um exemplar motivo jornalístico - afinal, como aprendi com minha madrinha de blog Alessandra Alves, o que é notícia não é o cão que morde o homem e sim o homem que morde o cão -, acabo de saber que tal ocorrência é das mais remotas possibilidades matemáticas, sendo inferior a um em um milhão de eventos.
Jornalistas de plantão enumeraram pelo menos cinco recentes casos como esse, mostrando que o acontecido não é manchete tão incomum quanto aparenta.

Para provar a ausência de ineditismo, venho partilhar uma outra história que se iniciou em terras brasilis (em terras soteropolis, pra ser precisa) há exatos dezenove anos. Há este tempo, século passado, ano de 1987, nasciam gêmeas de cores diferentes na cidade do Salvador. Uma branca e a outra preta. O caso despertou espanto na maternidade e um pacto comunhando o silêncio entre os presentes teve que ser feito, a fim de evitar devaneios acerca da moral dos pais e suas crianças. Na agitação, uma pergunta: como esconder algo tão evidente? Tudo era sugestões e soluções mirabolantes naquela improvisada sala de justiça. Diante do problema que urgia por uma saída, uma testemunha sensata elegeu quatro das possibilidades mais providenciais. Analise:

1) Forjando um suposto tratamento de icterícia (doença pouco grave que ataca recém-nascidos), Joana seria submetida a severos banhos de sol de meio dia bezuntada em óleo de urucum com beterraba, enquanto Lígia receberia abrigo absoluto de luz, exceto depois de mergulhada (até o calcanhar) numa bacia de Coppertone;

2) Como era esperado um casal ao invés das duas meninas - verdade verdadeiríssima, houve engano na ultrassonografia e era pra ser Lígia e Victor! Pense que por anos eu sofri a dor de saber que meu nome foi escolhido ao léu, assim, às pressas - podia-se alegar troca nos berçários, criando de brinde o mote pra um posterior novelão no Fantástico;

3) Depois de passar a primeira infância coberta por véus e tecidos, Lígia, ao atingir certa idade, viajaria pelo norte da África ou por ares australianos onde, em contato com aborígenes, adotaria pinturas tribais como devoção religiosa e voltaria ao Brasil pronta pra conviver com a hermana sem levantar qualquer questão;

4) Portadora de raro caso de fotossensibilidade, o bebê Joana seria mandado para os Alpes Suíços onde poderia crescer com mais conforto. Ao cabo de vários anos, curada e de volta ao Brasil, Joana usaria como álibi a falta de calor, de sal, de sol, de cores tropicais que empalidecem, juraria, um negro do Alabama.

Abro a caixa de comentários para que você, caro leitor, dê o seu palpite sobre o enredo da história das mabaças. O final você decide!

12 comentários:

Anônimo disse...

Vou resumi meu comentário a uma única letra repetidas vezes:

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

Vc é ótima, definitivamente.

Adorei.

Anônimo disse...

o Final é um preludio d´um assassino.

ou um epitafio sinuoso e rápido
num piscar o esperar mais e mais

evoé

e parabens pela escrita

Anônimo disse...

incrivel trama!
vendam pra televisa, (acrescentando um amor dividido pelas duas, plantações de café e aminésia dos genitores)
e sejam felizes para sempre!
saudade Jô!

Anônimo disse...

Vou confessar que sempre tive medo de gêmeos...sei lá...me geram a sensação de estar diante de algo criado em laboratório sempre...quando são muito parecidos...
Com vocês bem diferentes fisicamente, acredito que meus medos tenham sido um tanto quanto reduzidos.
Quanto ao final da hostória, é interessante que não o encontremos, pois as possibilidades diversas é que são ricas e curiosas. Afinal, quanta criatividade, né?//
Beijos para as duas...

Anônimo disse...

Jô, parece-me que uma boa conversa deixa tudo resolvido. Ou não. Por exemplo, voce poderia, quando o assunto voltar pra roda, dizer, com ar tranquilo e indiferente:
" Eu na verdade nasci japonesa e minha irmã chinesa. Daí a gente resolveu mudar, tomamos uns trecos e, eis!"
Ou então, com um aspecto sombrio e à meia-voz, olhando fixamente e com fria calma pra todos à volta: "Não contem pra ninguém. Eu na verdade sou uma agente infiltrada. Nem brasileira eu sou. Faço parte dos Serviços Secretos da Ilha de Man. God Save The Queen!".
Ou, talvez (eu usaria este método), quando alguém comentar tipo: "Ué, mas se voces são gêmeas por que não são idênticas?" assim responder: "Espera, como assim não somos? Voce está falando sério? Vou observar quando chegar em casa. Nossa, sério que voce acha isso? Puxa, se for verdade, que rude golpe!"
Jô, voce gostou das sugestões?
PS: Se nada disso der certo, nada melhor que "Shut Up", com os Black Eyed Peas.

Antonio Rimaci disse...

mais um blog do bom para me ajudar a ocupar minhas tardes vazias no estágio... Parabéns, garota!

Anônimo disse...

Talvez o momento do "fazer" explique a diferença. E se uma foi iluminada pelo sol e veio clara -com olhos onde a parte branca era azul - e hoje passeia por sobre as coisas, sôfrega em saber? E se a outra foi contemplada pelo luar, e se encerra em mistérios que só à noite negra, morena, é dado o mister de explicar? De uma coisa, duas, decerto, ficam entre o claro-escuro: se completam...
(e o sorriso de uma, abre a alma da escrita da outra)

Anônimo disse...

Joana, vc é uma figura! E essa história das "gêmulas multicor" renderia mesmo uma boa matéria no Fantástico.

Leo Costa disse...

Encantado!

Joana poderia, com tanto talento, esconder-se para o resto da vida escrevendo esse blog maravilhoso. Perfeito, para evitar suspeitas!

Feliz disse...

hummm... difícil. vou ler de novo e pensar. beijo.

Leo Costa disse...

O seu comment foi quase um post me acabei de rir. leo, prazer!

Anônimo disse...

Aprendi muito