segunda-feira, maio 07, 2007


A nova lenda de Tristão

Tristão era o último homem da civilização Momocata, mas não sabia disso até retornar à sua terra e encontrá-la devastada.
Distante, passou cinco anos bem vividos - teve que recorrer à memória para se consolar. Escreveu um livro. Construiu um barco e nele navegou o estreito de Gibraltar. Curou o melhor rum do universo, com canas frescas que cultivou e triturou no próprio quintal, quando aprendiz de um cigano do Caribe. Fez suas vezes de médico em visita a uma vila brasileira, remediando cólicas menstruais de pré-adolescentes em flor com chá de papel crepom e açúcar.
Matou um homem sem motivo.
Bem, foram muitas coisas que Tristão fez nesses anos e nem todas elas são relatáveis ou louváveis.
Mas fez uma coisa de que se lembra todo santo dia quando acorda e quando se deita, quando come, bebe ou toma banho. A lembrança apenas tange o pensamento, porque o entristece, e como agregada à rotina, ele pensa nela ao fazer determinadas atividades. Quando relaxa e permite à lembrança inundar sua mente, é certo de que chora, mas não faz isso sempre.
A lembrança de que falo é o encontro com uma moça por quem Tristão se apaixonou perdida e imediatamente.
Eles tinham ambos vinte e dois anos e estavam no bar, naquela noite, por motivos parecidos. Ela tinha tédio e ele não tinha dinheiro. Pediram a mesma bebida e se notaram de longe.
Difícil explicar como tudo aconteceu, mas digo que foi rápido e recíproco. Os dois se apaixonaram um pelo outro, completamente, numa dessas noites de que nada se espera a não ser o consolo de um drink quente.
Depois de muitas doses, de muitos beijos, de muitos olhares e de muitas melhores-conversas-da-minha-vida, o destino daquele amor festivo foi a casa operária da bela, um pequeníssimo apartamento de um imenso conjunto habitacional daquela industrial cidade.
Ninguém, nem mesmo a chuva tinha mãos, pés, ventre, cotovelos, nuca tão finos quanto aquela mulher. E nunca nenhum homem foi tão desenvolto com uma dama como Tristão naquela noite, curta como um segundo, que durou até o dia alaranjado se assanhar.
“Tudo o que eu sei termina aqui”, soprava o coração apaixonado de Tristão ao mirar o belo corpo da amada adormecido na cama.
Tristão levantou-se, decidido a buscar numa venda qualquer, próxima, os itens para o melhor café da manhã da vida de sua amada. Sacodiu os bolsos e contou o seu escasso dinheiro.
Disparou a andar, passando pela imensidão de prédios de igual tamanho, igualmente pintados e dispostos em ruas iguais. Livrou-se do labirinto que desembocava numa rua diversa, cheio de lugares em que se vendiam frutas tenras e cheirosas, pão fresquinho e leite de cabra.
Encheu os braços de sacolas e com saudade do seu ninho, andou depressa pelo labirinto. Mas todos eram prédios iguais e tão iguais eram as ruas. Sem norte, andou e depois correu o quanto pôde, voltando à rua diversa diversas vezes, tentando em vão refazer o caminho. Tocou, errando, a campainha de centenas de apartamentos.
Tristão não sabia mais onde era a casa da moça.
Ele largou as sacolas, sentou na calçada e chorou uma poça de lágrimas. Chutou as sacolas, pisou nas frutas, gritou e enfim desfaleceu de fadiga.
Nunca mais encontrou sua Isolda.

14 comentários:

Anônimo disse...

imagem linda do caralho

Ricardo M. P. Frota disse...

Obrigado por visitar meu BLOG. Abraço! Uma hora eu vou gastar um tempinho para ler o seu todinho... Hehehe... Mas semana que vem... Nessa estou estudando para uma prova!

Elton Pinheiro disse...

Primeira visita.., vim por causa do título, la vie en close.... Mas estou escrevendo por causa dos hai kais, gostei bastante desse

" pra que tanta fala
tanto texto maldito
tanta besteira que cala
o importante a ser dito

faz-se silêncio na sala
pra escutar velho mito
um professor que é mala
e acha que fala bonito "

joanarizerio@gmail.com disse...

na verdade, elton, esse é da ala dos não hai kais. eu gostei muito dele tb, e se deu de fato numa aula chata pra caramba... :)

Alexandre Espinheira disse...

Conheces a Opera de Wagner baseada na lenda de Tristão e Isolda?
A abertura, além de belíssima, é uma marco na evolução da harmonia da música feita do sec. XX.

Mais uma vez parabéns!

Anônimo disse...

É um dos meus romances favoritos ... oh Tristão, que vida tão triste!
Deu saudade do livro, acho que vou reler.

beijos
;)

Anônimo disse...

Moral da história: tudo conspira contra quem não dinheiro. Tivesse uma graninha sobrando, Tristão ligaria para um delivery qualquer e pediria "um café pra nós dois", como fez o Roberto Carlos.
:-)

joanarizerio@gmail.com disse...

HAHAHAHAHAHAHAHAHA

Anônimo disse...

Tá tudo tão igual

Anônimo disse...

tão igual ao que, dinda?

Anônimo disse...

..'as roupas os carros as ruas os prédios os filmes os perfumes as crianças as escolas a miséria a fotografia a doença o pensamento, os desejos os botões em suas casas...É´o poder histérico do consumo nos empurrando para um mundo de desejos vazios e percepçôes esquizofrenicas.
(o seu Blog é diferente, nos faz pensar he he)
Beijos, saudades

joanarizerio@gmail.com disse...

lindaaaaaaaa

Anônimo disse...

massa,jô.

Pax disse...

Massa!
Muito bom mesmo!